terça-feira, 26 de abril de 2011

Nós[talgia]...



Ontem, pela primeira vez em alguns anos, senti aquela sensação de pré-morte. Se é que se pode colocar dessa maneira. Na adolescencia sentia bastante isso. Coisas absurdas do tipo, o ônibus vai virar, o prédio vai desmoronar, serei atropelada, etc. Que mórbido, não é? [risos]
Ontem foi tudo tão diferente. Senti como se realmente fosse o meu último dia presente. Então, resolvi aproveitar cada senssaçãozinha do que o dia poderia me proporcionar. Admirei as nívens densas, deixei o sol penetrar em minha pele branca-quase-amarela, aproveitei ao máximo o vento frio do inicio de noite. Joguei conversa fora com estranhos sorri de uma piada sem graça, liguei para minha melhor amiga, brinquei com meus cães, reguei a samambaia de casa, tomei um café bem quente, pensei em VOCÊ, e deixei o sono chegar.
 Mas antes disso, avistei na minha estante o livro de Caio Fernando Abreu, Morangos Mofados. Livro este, que já havia lido a umas duas semanas. E ao folea-lo, deparei com esse conto. Lindo demais. Verdadeiro demais. O amor que transcede o tempo, as diferenças, as verdades, as situações de cada um, tudo. Nostalgico, como tem sido a minha vida. Não que seja bom viver de nastalgia, mas é que as vezes, só as vezes, é gostoso.
"E quem sabe, um dia, eu não passe por uma situação assim" - pensei. Então, resolvi viver mais um pouco...


O dia em que Jupter encontrou Saturno.
Caio F. Abreu - Morangos Mofados.


Foi a primeira pessoa que viu quando entrou. Tão bonito que ela baixou os olhos, sem querer querendo que ele também a tivesse visto. Deram-lhe um copo de plástico com vodka, gelo e uma casquinha de limão. Ela triturou a casquinha entre os dentes, mexendo o gelo com a ponta do indicador, sem beber. Com a movimentação dos outros, levantando o tempo todo para dançar rocks barulhentos ou afundar nos quartos onde rolavam carreiras e baseados, devagarinho conquistou uma cadeira de junco junto a janela. A noite clara lá fora estendida sobre Henrique Schaumann, a avenida poncho & conga, riu sozinha. Ria sozinha quase o tempo todo, uma moça magra querendo controlar a própria loucura, discretamente infeliz. Molhou os lábios na vodka tomando coragem de olhar para ele, um moço queimado de sol e calças brancas com a barra descosturada. Baixou outra vez os olhos, embora morena também, e suspirou soltando os ombros, coluna amoldando-se ao junco da cadeira. Só porque era sábado e não ficaria, desta vez não, parada entre o som, a televisão e o livro, atenta ao telefone silencioso. Sorriu olhando em volta, muito bem, parabéns, aqui estamos.

Não que estivesse triste, só não sentia mais nada.

Levemente, para não chamar atenção de ninguém, girou o busto sobre a cintura, apoiando o cotovelo direito sobre o peitoril da janela. Debruçou o rosto na palma da mão, os cabelos lisos caíram sobre o rosto. Para afastá-los, ela levantou a cabeça, e então viu o céu tão claro que não era o céu normal de Sampa, com uma lua quase cheia e Júpiter e Saturno muito próximos. Vista assim parecia não uma moça vivendo, mas pintada em aquarela, estatizada feito estivesse muito calma, e até estava, só não sentia mais nada, fazia tempo. Quem sabe porque não evidenciava nenhum risco parada assim, meio remota, o moço das calças brancas veio se aproximando sem que ela percebesse.

Parado ao lado dela, vistos de dentro, os dois pintados em aquarela - mas vistos de fora, das janelas dos carros procurando bares na avenida, sombras chinesas recortadas contra a luz vermelha.

E de repente o rock barulhento parou e a voz de John Lennon cantou every dau, every way is getting better and better. Na cabeça dela soaram cinco tiros. Os olhos subitamente endurecidos da moça voltaram-se para dentro, esbarrando nos olhos subitamente endurecidos dos moço. As memórias que cada um guardava, e eram tantas, transpareceram tão nitidamente nos olhos que ela imediatamente entendeu quando ele a tocou no ombro.

-Você gosta de estrelas?
-Gosto. Você também?
-Também. Você está olhando a lua?
-Quase cheia. Em Virgem.
-Amanhã faz conjunção com Júpiter.
-Com Saturno também.
-Isso é bom?
-Eu não sei. Deve ser.
-É sim. Bom encontrar você.
-Também acho.

(Silêncio)

-Você gosta de Júpiter?
-Gosto. Na verdade "desejaria viver em Júpiter onde as almas são puras e a transa é outra".
-Que é isso?
-Um poema de um menino que vai morrer.
-Como é que você sabe?
-Em fevereiro, ele vai se matar em fevereiro.

(Silêncio)

-Você tem um cigarro?
-Estou tentando parar de fumar.
-Eu também. Mas queria uma coisa nas mãos agora.
-Você tem uma coisa nas mãos agora.
-Eu?
-Eu.

(Silêncio)

-Como é que você sabe?
-O quê?
-Que o menino vai se matar.
-Sei de muitas coisas. Algumas nem aconteceram ainda.
-Eu não sei nada.
-Te ensino a saber, não a sentir. Não sinto nada, já faz tempo.
-Eu só sinto, mas não sei o que sinto. Quando sei, não compreendo.
-Ninguém compreende.
-Às vezes sim. Eu te ensino.
-Difícil, morri em dezembro. Com cinco tiros nas costas. Você também.
-Também, depois saí do corpo. Você já saiu do corpo?

(Silêncio)

-Você tomou alguma coisa?
-O quê?
-Cocaína, morfina, codeína, mescalina, heroína, estenamina, psilocibina, metedrina.
-Não tomei nada. Não tomo mais nada.
-Nem eu. Já tomei tudo.
-Tudo?
-Cogumelos têm parte com o diabo.
-O ópio aperfeiçoa o real
-Agora quero ficar limpa. De corpo, de alma. Não quero sair do corpo.

(Silêncio)

-Acho que estou voltando. Usava saias coloridas, flores nos cabelos.
-Minha trança chegava até a cintura. As pulseiras cobriam os braços.
-Alguma coisa se perdeu.
-Onde fomos? Onde ficamos?
-Alguma coisa se encontrou.
-E aqueles guizos?
-E aquelas fitas?
-O sol já foi embora.
-A estrada escureceu.
-Mas navegamos.
-Sim. Onde está o Norte?
-Localiza o Cruzeiro do Sul. Depois caminha na direção oposta.

(Silêncio)

-Você é de Virgem?
-Sou. E você, de Capricórnio?
-Sou. Eu sabia.
-Eu sabia também.
-Combinamos: terra.
-Sim. Combinamos.

(Silêncio)

-Amanhã vou embora para Paris.
-Amanhã vou embora para Natal.
-Eu te mando um cartão de lá.
-Eu te mando um cartão de lá.
-No meu cartão vai ter uma pedra suspensa sobre o mar.
-No meu não vai ter pedra, só mar. E uma palmeira debruçada.

(Silêncio)

-Vou tomar chá de ayahuasca e ver você egípcia. Parada do meu lado, olhando de perfil.
-Vou tomar chá de datura e ver você tuaregue. Perdido no deserto, ofuscado pelo sol.
-Vamos nos ver?
-No teu chá. No meu chá.

(Silêncio)

-Quando a noite chegar cedo e a neve cobrir as ruas, ficarei o dia inteiro na cama pensando em dormir com você.
-Quando estiver muito quente, me dará uma moleza de balançar devagarinho na rede pensando em dormir com você.
-Vou te escrever carta e não te mandar.
-Vou tentar recompor teu rosto sem conseguir.
-Vou ver Júpiter e me lembrar de você.
-Vou ver Saturno e me lembrar de você.
-Daqui a vinte anos voltarão a se encontrar.
-O tempo não existe.
-O tempo existe, sim, e devora.
-Vou procurar teu cheiro no corpo de outra mulher. Sem encontrar, porque terei esquecido. Alfazema?
-Alecrim. Quando eu olhar a noite enorme do Equador, pensarei se tudo isso foi um encontro ou uma despedida.
-E que uma palavra ou um gesto, seu ou meu, seria suficiente para modificar nossos roteiros.

(Silêncio)

-Mas não seria natural.
-Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.
-Natural é encontrar. Natural é perder.
-Linhas paralelas se encontram no infinito.
-O infinito não acaba. O infinito é nunca.
-Ou sempre.

(Silêncio)

-Tudo isso é muito abstrato. Está tocando "Kiss, kiss, kiss". Por que você não me convida para dormirmos juntos.
-Você quer dormir comigo?
-Não.
-Porque não é preciso?
-Porque não é preciso.

(Silêncio)

-Me beija.
-Te beijo.

Foi a última pessoa que viu ao sair. Tão bonita que ele baixou os olhos, sem saber sabendo que ela também o tinha visto. Desceu pelo elevador, a chave do carro na mão. Rodou a chave entre os dedos, depois mordeu leve a ponta metálica, amarga. Os olhos fixos nos andares que passavam, sem prestar atenção nos outros que assoavam narizes ou pingavam colírios. Devagarinho, conquistou o espaço junto à porta. Os ruídos coados de festas e comandos da madrugada nos outros apartamentos, festas pelas frestas, riu sozinho. Ria sozinho quase sempre, um moço queimado de sol, com a barra branca das calças descosturadas, querendo controlar a própria loucura, discretamente infeliz.

Mordeu a unha junto com a chave, lembrando dela, uma moça magra de cabelos lisos junto à janela. Baixou outra vez os olhos, embora magro também. E suspirou soltando os ombros, pés inseguros comprimindo o piso instável do elevador. Só porque era sábado, porque estava indo embora, porque as malas restavam sem fazer e o telefone tocava sem parar. Sorriu olhando em volta.

Não que estivesse triste, só não compreendia o que estava sentindo.

Levemente, para não chamar a atenção de ninguém, apertou os dedos da mão direita na porta aberta do elevador e atravessou o saguão de lado, saindo para a rua. Apoiou-se no poste da esquina, o vento esvoaçando os cabelos, e para evitá-lo ele então levantou a cabeça e viu o céu. Um céu tão claro que não era o céu normal de Sampa, com uma lua quase cheia e Júpiter e Saturno muito próximos. Visto assim parecia não um moço vivendo, mas pintado num óleo de Gregório Gruber, tão nítido estava ressaltado contra o fundo da avenida, e assim estava, mas sem compreender, fazia tempo. Quem sabe porque não evidenciava nenhum risco, a moça debruçou-sena janela lá em cima e gritou alguma coisa que ele não chegou a ouvir. Parado longe dela, a moça visível apenas da cintura para cima parecia um fantoche de luva, manipulado por alguém escondido, o moço no poste agitando a cabeça, uma marionete de fios, manipulada por alguém escondido.

De repente um carro freou atrás dele, o rádio gritando "se Deus quiser, um dia acabo voando". Na cabeça dele soaram cinco tiros. De onde estava, não conseguiria ver os olhos da moça. De onde estava, a moça não conseguiria ver os olhos dele. Mas as memórias de cada um eram tantas que ela imediatamente entendeu e aceitou, desaparecendo da janela no exato instante em que ele atravessou a avenida sem olhar para trás.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Quando?

Eu segui amando e redesenhando cada dobrinha da sua pele, cada cheiro escondido dos seus cantinhos, cada cílio torto, cada risada alta, cada deslumbre puro com a vida, cada brilho nos olhos quando o mar estivesse bonito demais. Cada preguiça, cada abandono, cada estupidez, cada limitação, cada bobeira. Amava seus erros assim como amava os acertos, porque o que eu amava, enfim, era você. E eu me perguntava, quase já sem agüentar mais, sem entender tamanha entrega burra, quando isso finalmente teria um fim. Quando minha coluna ia voltar a ser ereta, minha cabeça erguida e meus passos firmes? Quando eu iria superar você?” 

Tati Bernardi

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Ser Racional é...



Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente? Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia — qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido.


Caio F. Abreu.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Eu, é que NÃO vou....



'Dessa vez não vou evitar dizer o que está na minha cabeça só porque eu sei que minha mente geminiana vai negar no dia seguinte, não fugirei de palavras bonitas porque quem diz não é uma pessoa perfeita, não arrumarei mil defeitos pra brigar contra as novecentas e noventa e nove qualidades, não desviarei meus olhos por medo de ter minha mente lida, não sumirei por medo de desaparecer, não vou ferir por medo de machucar, não serei chata por medo de você me achar legal, não vou desistir antes de começar, não vou evitar minha excentricidade, não vou me anular por sentir demais e logo depois não sentir nada, não vou me esconder em personagens, não vou contar minha vida inteira em busca de ter realmente uma vida.
Dessa vez não vou querer tudo de uma vez, porque sempre acabo ficando sem nada no final.
Estou apostando minhas fichas em você e saiba que eu não sou de fazer isso. Mas estou neste momento frágil que não quer acabar. Fiquei menos cafajeste, menos racional, menos eu. E estou aproveitando pra tentar levar algo adiante. Relacionamentos que não saem da primeira página já me esgotaram, decorei o prólogo e estou pronta pro primeiro capítulo. '

Caio F. Abreu

Contraditória negação, completamente intencional de tudo que nós [Geminianos] somos! 

terça-feira, 19 de abril de 2011

Eu tenho perdido muito de mim. E cresce uma gigante vontade de me resgatar. Mas sou humana. Tenho perdido o jeito e a fala.  O medo cresce. Ele não se vai, mas é de jeito nenhum. Medo do deslize. De falar algo indevidamente. De ser mal interpretada. De não ser... não ser. De errar... Mas, eu sou humana, oras!
Será o medo de ser OU NÃO eu mesma?
Preciso muito resolver. Me resolver acima de qualquer coisa. Me cuidar. Observar mais os meus detalhes, minhas milindrosidades... E isso, só cabe a mim, é coisa minha.

Acho que tenho conseguido. Pelo menos um pouco.

“E tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era”
Caio Fernando Abreu.

"Ô menina, veja bem… Ouça uma boa música, leia um bom livro e bola pra frente. Pode parecer clichê, mas funciona. Vá por mim."
Caio Fernando Abreu.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

A importância da Solidão.



Estou me sentindo só. Mesmo com todos em volta. Hoje, eu me sinto só. 
Mas, sem pena, ou autopunições. Estar só vai ser importante pra mim. A me ver, me conhecer. Me "ajeitar". Me consertar, me construir. A solidão será importante pra mim. Aqui tem 1,65m pra descobrir. Tem uma série de quadros na parede pra ajustar. Tem crises pra aprender a lidar. Certas "doenças" pra curar. Coisas minhas, e que ninguém tem de certo, obrigação de relevar ou suportar. Preciso canalizar forças em mim, meu autoconhecimento, e disso, preciso faz tempo. Preciso "expurgar os meus cancêres", "exorcisar os meus demônions".

Eu tenho tanto a aprender sobre mim. Tenho tanto, mas tanto. E eu não posso pôr sobre os ombros de ninguém essa tarefa. Eu não posso responsabilizar ninguém e muito menos penalizar ninguém.
É um processo meu. Únicamente e irrefutavelmente meu. Se será lento ou não, cabe o tempo me explicar isso. 

Essa noite, me ocorreu um fato inusitado. Um sonho. Sonhei com algúem que JAMAIS poderia imaginar. Alguém que por um tempo, um certo tempo, torci o nariz. Não há ódio, nunca houve de fato, isso assumo. Mas, nunca houve "amores". E essa pessoa me disse algo importantíssimo para o meu resgate. Acordei achando tudo tão estranho. Questionando a sua figura em meu subconsciente, e o que ela veio me dizer. E não sei se ela veio me acrescentar, ou fazer a diferença. Melhor deixar quieto, entre mim e eu.

Aos meus AMORES, aqueles que realmente amei, perdão. Pelos sufocamentos, pelas grosseirias, pelas "loucuras", pelos medos, pelas inseguranças, por se jogar sem pensar, pelo ódio, pela dor. Pela insenssatez, pela petulância, pelas chatices, pela rotina, pela falta de.
Em todos, houve sim AMOR. Em todos, eu quis depositar o melhor de mim, mesmo não obtendo sucesso. Em todos eu tentei ser o eu mesma, mesmo não sendo o ideal. Em todos, eu tentei me doar da maneira mais pura.

Perdoem as projeções. Minhas e suas.

Mas, agora a solidão talvez irá fazer parte de mim. E eu não pretendo fazer disso, algo ruim.

Eu preciso me buscar.